sexta-feira, 25 de junho de 2010

A importância da vinculação

As questões da vinculação, constituem, por si só, uma importante componente no desenvolvimento do ser humano, sendo, também, consideradas cruciais no decorrer da relação pedagógica, visto que “Educar com afecto é tanto ou mais importante do que educar com os meios e os recursos pedagógicos ideais, para um adequado desenvolvimento das crianças.” (Esteves, 2005, p.11), pelo que se revela fundamental uma abordagem a este conceito.
É importante salientar, que a teoria da vinculação de Bowlby, teve como foco a teoria da impregnação e os estudos de Harlow, sobre o comportamento do macaco rhésus, criado em isolamento social, ou seja, segundo Bowlby, “(…) a vinculação é um sistema primário específico, isto é, está presente a partir do nascimento com características próprias da espécie. Tão natural como a respiração, não deriva de outra necessidade primária, tal como a satisfação das necessidades alimentares.” (cit. in Montagner, 1993, p.23). Desta forma, Bowlby entendeu que “(…) todo o comportamento de recém-nascido que tem como consequência e como função criar e manter a proximidade ou o contacto com a mãe, ou pessoa que a substitua”. (Montagner, 1993, p.23).
Um pouco mais tarde, surgiram os estudos realizados por Aisworth que “(…) parecem constituir, assim, uma prova do que prevê a teoria da vinculação de Bowlby: a qualidade de vinculação entre o bebé e a mãe influenciaria de maneira decisiva os outros sistemas relacionais da criança ao longo de todo o seu desenvolvimento. (Montagner, 1993, p.38).
Neste sentido, é-nos possível depreender que, quando a criança se depara com uma relação afectiva, em que se sente desejada e acarinhada, desenvolve sentimentos básicos de segurança e confiança quer em si própria quer nos que a rodeiam, sentimentos estes que são cruciais para o seu desenvolvimento emocional. Uma relação afectiva com estas características denomina-se por vinculação, não sendo esta cingida à relação materna, tal como é referido por Bowlby e Ainsworth, que afirmam que “(…) qualquer adulto que preste determinados tipos de cuidados em quantidade e qualidade à criança pode



adquirir este estatuto.” (Esteves, 2005, p.11). É importante referenciar, ainda, que segundo Guedeney, “(…) o sistema de vinculação define-se como aquilo que mantém a proximidade e o seu corolário interno, o sentimento de segurança. Tudo o que favorece a proximidade, dando uma sensação de segurança, pertence ao comportamento de vinculação (…)” (2004, p.33).
Relativamente, ao processo de vinculação, no Centro de Acolhimento Temporário do Afonsoeiro, existe uma grande lacuna, tendo em conta que “(…) uma figura de vinculação é uma figura em direcção à qual a criança irá dirigir o seu comportamento de vinculação(…)” (Guedeney, 2004, p.34-35), ou seja, “(…) é susceptível de se tornar figura de vinculação qualquer pessoa que se envolva numa interacção social viva e durável com o bebé e que responda facilmente aos seus sinais e às suas aproximações.” (idem). Neste sentido, o CAT, em questão, não desenvolve uma prática que dê relevância a este processo, na minha opinião, porque não existe um trabalho de equipa coerente e linear, que é fundamental num contexto deste género.
Ainda alusivo à figura de vinculação, Holmes (1995) acredita que “(…) a criança tem uma tendência inata a vincular-se, em especial a uma figura, o que significa que, num grupo estável de adultos, uma das figuras irá tornar-se a figura de vinculação privilegiada” (cit. in Guedeney, 2004, p.35), o que nos indica que numa relação pedagógica equilibrada, entre o adulto e a criança deverá estar a afectividade, no entanto, é importante salientar que, a criação de uma relação deste género, passa pela forma como o adulto interage com a criança. No Centro de Acolhimento em questão, apesar da inexistência de trabalho de equipa, as crianças estão, nitidamente, vinculadas à educadora, apesar de esta não demonstrar muita afectividade para com as crianças, na minha opinião, isto acontece, pois as monitoras trabalham por turnos e, por vezes, as crianças estão dias sem ver a mesma, portanto a pessoa que está presente quando as crianças acordam nunca é a mesma, a que está presente nos momentos de higiene nunca é a mesma, a pessoa que está presente nas novas conquistas e aprendizagens de cada criança nunca é a mesma, a pessoa que deita as crianças nunca é a mesma. Por outro lado, a educadora, está na instituição todos os dias (excepto Domingos e Segundas), no período das 10h às 19h30. Para além, de ser ela a fazer a inclusão a criança no CAT, também é ela que saí com as crianças, o que a torna muito importante para as mesmas,


apesar de não fazer quaisquer cuidados higiénicos ou brincadeiras, que exijam mais do que actividades de sala, como por exemplo, não presencia momentos fundamentais como os pesadelos durante a noite
Contudo, apesar desta situação, neste CAT, concretamente, o facto de se saber que são “(…) são possíveis [outras vinculações] entre a criança e outras pessoas, em particular com uma puericultora ou educadora de infância na creche, e uma auxiliar educativa ou uma professora na pré-primária (…)” (Montagner, 1993, pp.223-224), descansa-nos um pouco, pois contradiz que as crianças institucionalizadas, por exemplo, as quais outrora se pensava que como não tinham contacto com a mãe, já não poderiam vincular-se a ninguém, comprometendo, negativamente, o seu desenvolvimento enquanto indivíduo. No que diz respeito à institucionalização a “(…) figura de vinculação é uma figura em direcção à qual a criança irá dirigir o seu comportamento de vinculação” (Montagner, 1993, pp.34-35) e, independentemente, do motivo pelo qual as crianças estão no CAT, não sabemos se existia ou não, uma pessoa significativa, com quem a criança estabelece-se comportamentos de vinculação, o que compromete o desenvolvimento da criança, pois tal como refere A. Guedeney, “(…) a perda de uma figura de vinculação neste período da vida representa uma mudança tão considerável que é qualitativamente diferente de uma perda que surja noutra altura da vida.” (2004, p.138). Portanto, é crucial ter em conta que “(…) a experiência precoce influencia, de facto, todo o comportamento posterior, de forma permanente” (Gomes- Pedro, 2005, p.73).
Desta forma, e acreditando que “(…) las experiencias de la primera infância son la base de la salud mental de la persona.” (Punset, 2008, p.120), pode deduzir-se que a “(…) estabilidade do mundo exterior, apresentada pela pessoa de vinculação, constitui a base biológica da identidade, a aquisição da permanência, o sentimento do estável (Cyrulnik, 1989, p.262).
Como tal, um educador nunca se poderá esquecer do porquê de cada criança estar num centro de acolhimento, consciencializando-se de que “(…) a criança sem família vive num mundo imprevisível. Em seu redor não há esse ritmo, esse regresso da mesma voz, do mesmo cheiro, do mesmo quarto, da mesma canção que desenvolve nela um sentimento de permanência. Qualquer mudança a lança no desconhecido” (Cyrulnik,


1989, p.263), cabendo, assim, ao educador minimizar o sentimento de perda. O educador deverá, assim, ter três características fundamentais, nomeadamente: congruência, aceitação incondicional positiva e empatia. A congruência implica que o educador se mostre como é na realidade, ou seja, passa por ser «verdadeiro», consigo próprio e com os outros; aceitar os outros sem o julgar é o que, vulgarmente, designamos por aceitação incondicional positiva. E cabe ao educador dar a entender que compreende o que a criança está a sentir e vivenciar – empatia.
O educador deve, ainda, compreender que a criança, nesta situação, tem necessidade de procurar um objecto que a tranquilize ou um substituto de vinculação, uma vez que, “(…) o único objecto estável, a única permanência sensorial é constituída pelo seu próprio corpo” (Cyrulnik, 1989, p.263).
Relativamente ao meu local de estágio, já referi que considero muito difícil qualquer criança desenvolver, neste contexto, comportamentos vinculativos relativos a algum adulto, inquietando-me, as crianças que vão, directamente, da maternidade para lá e que não chegam a ter contacto com uma figura materna. Por outro lado, também é preocupante a situação das crianças que mantinham uma figura de vinculação na família, e, posteriormente, sucedeu-se uma ruptura nesse elo de ligação, quando foram retiradas do seu meio familiar.
Assim, compreende-se que “(…) cada bebé, cada criança, baseia o seu sentido de coerência, a sua resiliência, enfim as suas forças, no modo como se sente amado, como se sente significativo, junto de quem vive com ele, junto de quem trata de si, junto de quem o ensina, junto de quem consigo se cruza.” (Gomes - Pedro, 2005, p.11), ou seja, torna-se fundamental que, a criança, seja acompanhada por uma figura de referência, que apoie os momentos significativos da sua vida.
Em suma, como já referi, anteriormente, a capacidade de vinculação é uma condição necessária, contudo não se desenvolve sem que sejam criadas as devidas condições. Neste sentido, embora seja defendido que, a capacidade de vinculação é inata, também se acredita que, é necessário um conjunto de características para que ela possa emergir, concretamente, um grupo estável de adultos, ou seja, uma família, podendo esta ser biológica ou adoptiva, o que realmente importa é que funcione como um núcleo família.


Referências bibliográficas:


 CYRULNIK, Boris (1989) – Sob o signo do afecto. Colecção Epigénese e Desenvolvimento. Instituto Piaget.
 ESTEVES, Sofia. A afectividade e a Relação Pedagógica – Como é que nos conseguimos esquecer de algo tão fundamental como os afecto!? In Cadernos de Educação de Infância, nº73, 2005, pp.11-12.
 GOMES-PEDRO, João (2005) – Para um Sentido de Coerência nas Crianças. Mem Martins: Publicações Europa-América.
 GUEDENEY, A. (2004) – Perturbações da Vinculação na Criança Pequena in GUEDENEY, Nicole; GUEDENEY, Antoine (coord.) (2004) – Vinculação: Conceitos e aplicações. 1ª edição. Lisboa: Climepsi Editores.
 GUEDENEY, N. (2004) – Conceitos-Chave da Teoria da Vinculação in GUEDENEY, Nicole; GUEDENEY, Antoine (coord.) (2004) – Vinculação: Conceitos e aplicações. 1ª edição. Lisboa: Climepsi Editores. Pp.:33-43.
 MONTAGNER, Hubert (1993) – A Vinculação: a aurora da ternura. Lisboa: Instituto Piaget.
 PUNSET, Eduardo (2008) – Todo se juega antes de los 5 años in Por qué somos como somos? 2ª edição. Madrid: Aguilar. Pp.:119-132.

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